FAMÍLIA
Dentre os desejos existentes no coração humano, um dos mais fortes é o
de viver em pleno estado de amor. Amar e ser amado parece ser a maior ambição
do ser humano e, por isso mesmo, a maior fonte de suas frustrações.
Infelizmente, muitas pessoas vivem em um estado permanente de miséria afetiva,
na solidão, com casamentos e com relações superficiais, insensíveis, sem nenhum
envolvimento profundo.
Por outro lado, as
pessoas não podem realizar-se pertencendo apenas à comunidade de interesse
comerciais, políticas. Elas necessitam de uma comunidade onde possam revelar-se
como são, valorizar-se com seus limites estabelecendo conhecimentos próximos. A
família é a primeira e permanente escola para a vida em comunidade. Nela a
pessoa nasce, cresce, amadurece, faz seu aprendizado de interação, de
cooperação e partilha, dando continuidade ao seu aprendizado, formando
sua própria família. É uma comunidade formadora, recebendo de Deus a
missão para constituir-se célula vital e primária da sociedade.
“A família é comunidade de amor. É escola
de vida com outros homens e precisa exercer influência na sociedade inteira.
Realmente, é na família que o homem começa a compreender que é um ser social e
elabora estratégias para um viver cristão e humano com outras pessoas”.[1]
Portanto, escola por
excelência, a família é a escola da vida e da prática da aceitação do outro,
espaço onde o ser humano se encontra como indivíduo. É uma comunidade de vida e
amor. Porém, necessita exercer uma influência marcante na sociedade já que nos
tempos de hoje, tem sido questionada por profundas transformações da sociedade
e na cultura, onde a perda do sentido da vida humana é constante, as pessoas
valem não por aquilo que são, mas por aquilo que possuem. O importante é ter,
fazer, produzir e consumir, infelizmente, um mal social moderno.
A família passa hoje
por grandes alterações em sua estrutura. No plano material, nota-se que ela
perdeu sua estabilidade que estava baseada na casa, passando de geração a
geração. Hoje, a família explodiu dispersando seus membros. No plano econômico,
a família não assume mais o caráter de uma unidade produtiva, onde gerar muitos
filhos era de suma importância na geração de riqueza, transformando-se em uma
unidade de consumo, reduzindo o número de filhos. No plano psicológico, o
casamento e a família, passaram a ser entendidos muitas vezes como sinônimos de
escravidão, pois, não possibilitam a mulher uma chance de liberdade. No plano
social, a família está mais dependente do Estado. No plano religioso, a
instituição familiar está perdendo seu aspecto religioso e sagrado.
“O estudo da família não pode ocorrer sem
uma compreensão dos movimentos históricos, culturais, econômicos etc, que são
inerentes aos processos humanos. A abordagem inter - disciplinar, a sociologia,
a psicologia, a política, a economia, a religião, etc, podem enriquecer a
compreensão de como se dá a estrutura familiar, suas diferentes formas de
acontecer e as influências do contexto que está inserida”.[2]
Além
disso, nos tempos modernos, é crescente o número de famílias que não podem
sobreviver com dignidade e ficam impedidas de cumprir seu papel social. Vive-se
hoje num contexto onde cresce a visão da interdependência das pessoas para a
realização do bem comum. Mesmo assim, diminui a proximidade entre grandes
parcelas da população, decrescendo desta forma, a comunhão e a capacidade de
relacionamento comunitário, aumentando o individualismo e a insensibilidade.
Também, é possível notar um grande vazio e insatisfações nas realizações das
pessoas independentes e auto-suficientes, que se encontram só, mesmo quando
rodeadas de amigos, instaurando a cultura do descompromisso, do “descartável”.
A cultura dominante
nos meios de comunicação serve a outros interesses, promovendo o reducionismo,
o materialismo e o secularismo, controlando os valores éticos/cristãos e a
família. Assim, os relacionamentos tendem a ser superficiais, passageiros e de
interesses próprios, tornando as pessoas objetos e não sujeitos de sua
existência.
Apesar de um crescente
desenvolvimento técnico científico, que proporciona recursos para uma vida de
progresso, é frustrante a realidade em que vive grande parcela da população,
sem condições de sobrevivência e de dignidade, não podendo realizar seus
direitos fundamentais. Numa observação mais atenta, percebe-se que as pessoas
“socialmente privilegiadas” são escravas da luta pelo poder do possuir, do
consumir, vivem sem experimentar a realização pessoal e interior, no vazio, com
ansiedades e tensões.
Outras transformações
de grande relevância estão presentes nos dias de hoje: de um modo geral, a
sociedade, e não mais a família, fornece ao indivíduo o trabalho profissional e
sua identidade social. Até a educação foi assumida, em boa porcentagem, pela
sociedade, os filhos escapam mais cedo da tutela dos pais. A família moderna
tornou-se nuclear ou conjugal, sendo constituída pelo casal e pelos filhos
menores, a hierarquia das idades e dos sexos estão se alterando com constância,
restringindo-se desta maneira, a autoridade paterna. Hoje, a livre escolha do
parceiro é um traço marcante da transformação da família. Nas diversas camadas
sociais, a família tem o impacto direto da pornografia, alcoolismo, drogas,
prostituição, da infidelidade conjugal, apresentando-se como vítima de uma
estrutura injusta, não possuindo mais um caráter uniforme.
“A
situação das famílias é também caracterizada por problemas sociais de natureza
diversas, tais como atentados freqüentes aos direitos humanos, exploração e
abuso, barreiras econômicas, sociais e culturais ao desenvolvimento integral de
seus membros”.[3]
A
partir dos pressupostos apresentados até aqui, concluí-se que a instituição
familiar tem passado por momentos de instabilidade, conflitos e crises. Vários
aspectos têm contribuído para este quadro. Entre eles, pode-se destacar os
seguintes: o relacionamento entre seus integrantes é vivenciado de forma e
mentalidade utilitarista, o consumismo introduziu o primado do trabalho e do
lucro em detrimento do diálogo, a evolução da família patriarcal para a família
celular trouxe solidão e insegurança, a mídia tem bombardeado o núcleo
familiar, já fragilizado, com mensagens banais, consumistas e desagregadoras, a
cultura urbana leva ao desinteresse recíproco dos indivíduos e da família.
Torna-se necessário,
portanto, que se crie mecanismos de defesa, apoiados não só na cultura , mas
também nos meios econômicos e legislativos, afim de salvaguardar a família das
ameaças que ela vem sofrendo contra a deformação de sua missão pelos meios de
comunicação social, pelo consumismo desenfreado e por legislações incoerentes e
injustas. Levar as famílias a se inserirem no campo político, promovendo os
seus verdadeiros valores. Tornando-a deste modo, uma comunidade de diálogo e de
humanidade, onde haja respeito, confiança, sinceridade no estar junto e na
co-responsabilidade, propiciando plena liberdade para a manifestação do amor,
seja ele conjugal, paterno, materno, filial ou fraterno. Uma política que
favoreça e promova as famílias das classes excluídas e menos favorecidas,
particularmente, nas áreas de habitação, emprego, previdência, saúde e
educação, e desenvolver canais que possam estimular a participação das famílias
no campo político, visando a promoção e a defesa de seus direitos e valores.
[1] CNBB. Casamento e Família no Mundo de Hoje. Petrópolis, Vozes, 1993,
pág. 46. O termo “homem” no texto, no meu entender, refere-se ao ser humano
total.
[2] ROSA Ronaldo Sathler & CASTRO Dagmar Silva Pinto de. Compreendendo
o que é Família. São Paulo, Editeo, 1995, pág. 9
[3] UNICEF. Família Brasileira: a base de tudo. São Paulo, Cortez, 1994, pág. 12.
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